terça-feira, 27 de agosto de 2013

Revista Capricho: quando o machismo confunde vergonha em dizer não, com a violência de exigir o sim!

A revista Capricho, lida por milhares de jovens brasileiras, já é conhecida por manter estereótipos machistas do papel da mulher na sociedade, na beleza, na paquera… Entretanto, a matéria publicada no final do mês passado com o título “Fiquei com vergonha de dizer não” passou dos limites, vem sendo bastante comentada no facebook e merece uma reflexão. Estamos tratando de uma revista que forma a opinião de uma juventude ainda insegura com seu corpo e sexualidade. Segundo a Capricho, tal matéria seria o relato da primeira vez de uma garota que não foi um conto de fadas. Na verdade trata-se de outra situação: O nome dessa matéria deveria ser algo do tipo “minha primeira vez foi um estupro: fui forçada mesmo não querendo”.
Em um UPDATE tardio a revista se defende e diz Entendemos que é nossa função instruir e munir adolescentes de autoestima e conhecimento para que enfrentem com mais tranquilidade os dramas relacionados à sua sexualidade. (…) De depoimentos como este, as garotas tiram lições que serão aplicadas em sua vida. A deste post é: “não faça nada contra a sua vontade” ou “tenha coragem de dizer não – ou você pode se arrepender para sempre”. Ironicamente o nome da página na internet é “Sexo – Perguntas e respostas” e qual foi a saída apontada pela revista pra resolver o problema da tal “primeira vez ruim”? A resposta pro estupro foi a vítima esperar o príncipe – aquele que não a violentaria. Ou seja, ou espere o príncipe ou arrependa-se para sempre – calada ou no máximo escrevendo um relato pra uma revista famosa.
Em primeiro lugar, reafirmando o conteúdo tradicional e machista da revista, coloca a mulher no papel de princesa na torre a espera do par perfeito, ou seja, enclausurando a sexualidade feminina no alto do reino de Camelot a espera da espada encantada. Como se o prazer feminino fosse dependente de um apego emocional, romântico, submisso, diante da figura do masculino. Quando a revista esquece de orientar o mais importante e  único critério absoluto para o prazer da mulher:  seu consentimento diante da situação, independente de como ou com quem seja- o critério é justamente ela dizer sim!
Em segundo lugar, a revista assume saber ser formadora de auto-estima e conhecimento. Nessa perspectiva, a Capricho  teria outra postura se tivesse algum ideal em orientar as meninas a partir de uma visão auxiliar na quebra dos preconceitos da sexualidade feminina, da heteronormatividade machista, munindo as jovens a nunca aceitar ou naturalizar qualquer tipo de violência e se tornar responsável pelas decisões que toma sobre seu corpo. Deveria orientar a vítima que escreveu esse relato e meninas que passaram por algo semelhante a procurarem uma delegacia da mulher e denunciarem o crime – inclusive disponibilizando abaixo da matéria endereços das principais delegacias do país.
Esse tipo de matéria, transvertida de libertadora – afinal, mulheres falarem de sexo ainda é um tabu – cumpre um papel extremamente conservador, reproduzindo a cultura do estupro que vivemos no Brasil. Onde “goleiros Brunos” ou Gerald Thomas se sentem a vontade pra matar amantes, enfiar a mão nas partes íntimas de repórteres e depois se arrepender e culpar a vítima que ‘provocou’. Não há espaço para mensagens implícitas – como a Capricho diz que deixou no UPDATE que fez após a matéria – ou para o silencio.
Nós, da Assembleia Nacional de Estudantes – Livre, achamos que a mensagem da Capricho está muito clara, que a revista reproduz os padrões machistas que oprimem as mulheres jovens diariamente e que diante de uma matéria como essa é preciso repúdio! Esse tipo de matéria não só naturaliza como incentiva essa cultura, portanto, a Capricho torna-se tão culpada quanto aquele que comete o estupro, pois o consente e estimula por meio da naturalização.
É inegável que a Capricho não é a única, e que essas revistas são formadoras de opinião. Mas também não há como negar que, em geral, elas moldam a sexualidade de várias meninas afirmando a relação de submissão machista. “Como agradar seu paquera?”; “Ele não está afim de você: descubra o que está fazendo de errado?”;”Truques para agarrar seu boy”; e por aí vai… O combate ao machismo, a batalha pelos direitos iguais para as mulheres, também perpassa combater esses tipos de matérias que circulam na internet fazendo a cabeça da juventude que a lê.

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